1.5.10

Incompreensão.

Enlouqueci.
Levaram-me em mãos dentro de pés.
A braços dados com coisas.
Estou cheia de coisas até ao último dente.
Estou louca.
Não sei viver aqui.
Deixei de ser autêntica por que me disseca(ste)ram
Não sou autêntica.
O mundo pôs os olhos em mim.
Diante de mim.
Deixei de ver.
Queriam e pensavam uma coisa.
Eu sou outra coisa.
Essa coisa de que eles não gostam.
Deixei de sorrir porque deixei de ver.
Mente mórbida.
Não escrevo "e" porque não quero.
Doce angústia.
Levaram-me as pernas.
As mãos.
A boca.
A vontade.
Acabaram comigo sem saber sequer que acabavam comigo.
Estou acabada.
Findo-me assim ante os gritos.
Encerrando a vil tristeza entre lágrimas.
Secaram-me o corpo sob o sol ardente.
Esquecendo-se da minha pele branca de princesa.
Queimei.
Queimei e vivi dorida.
Magoada.
Não ando mais.
Cortam-me os passos.
Pouco importa.
Mergulho nesse mar salgado, gélido, escuro.
Na esperança de me encontrar de novo.
O caminho está vazio.
E a gente sorri-me.
Não quero sorrir(-vos)
Não me dão prazer.
Adeus.
Morrendo vão como eu.
" E hão-de ser pó, e cinza e nada."
Adeus.
Afastem vossos olhos dos meus.
Pois jamais quererei ver a cor da maldade.
Inocência.
Adeus.
Vou matam-me aos poucos.
Cortam-me as facas.
Meu coração está já apodrecido
Sem emoções possíveis a qualquer acto.
Acto I
Morrer.
Intervalo
Acto II
Aniquilação da primeira personagem.
Saí de peça ainda não ia a meio o III acto.
De pouco interesse.
Sou artista na mesma.
Expulsaram-me de cena.
Despediram-me.
Quantas personagens falam?
Falassem!
Fui morrer.
Adeus.
Não vejo nada.
As minhas emoções secaram.
Nem caras nem rostos nem nada.
Adeus, alvorada.
Vou-te matar para não morrer.
Nunca mais.
Viverei sempre.
Ainda que seja para vos tornar a existência insuportável.
Eu viverei e vocês viverão
Para vivermos uns com os outros
Para que assim nos magoemos uns aos outros
Matando-nos sempre por dentro.
Adeus.
Sóis cruéis.
Que vil raça.
Não sou gente.
Não sou gente.
Sou outra coisa.
Nessa coisa onde me levam.
Essas coisas.
Não compreendi.
Não compreendo nada.
Nunca nada.
Nunca coisa nenhuma.
Adeus às regras.
Não quero regras
Nem um aspirador dentro de casa.
São-me insuportáveis os gritos.
Adeus.
O caminho está a pedir-me.
Adeus.
Adeus.
Adeus.
Quero partir.
Quero partir para ficar longe daqui
Voltando quem sabe um dia.
E voltar, quem sabe, quando todos forem felizes.
Adeus.
O meu coração partiu-se.
Adeus.
O meu coração desfez-se em sangue.
Dêem-me uma droga qualquer para curar.
Não me dêem nada.
Não quero mais ter isto aqui no peito.
Adeus coração.
Não te quero mais.
Vai-te embora.
Eles metem-me uma máquina de bombear no teu lugar.
Serei eu.
Adeus.
Adeus.
Adeus.
Já não sou autêntica.
Já não sou autêntica.
Já não sou autêntica.
Enlouqueci.
Enlouqueci.
Enlouqueci.
Quem sou?
Não sei.
Deixo-me por ai ao abandono.
Até que o destino faça algo de mim.
Como nunca fizeram.
O cão largou o osso.
E fugiu.
Estava envenenado.
Morreu.
Então adeus.
(Não afastes teus olhos dos meus)
Morrerei também.
Depois de te matar.
(o amor morreu de amores)
A árvore falou-lhe.
Boa viagem diz
A tabuleta no meio da estrada
Segue.
Siga.
Corre.
Vai.
Ninguém é quem queria ser.
E tu nem uma coisa nem outra.
Quem sou?
Não sei.
Quem és?
Não sabes.
Saberás e eu saberei.
Cortei a unha.
E cortou-me a carne.
Estou a sangrar, da unha.
Da pele.
Sou uma poça vermelha no meio do chão.
Morri.
Morri.
M o r r i .
Adeus.
Ou até já.
Não, nunca.
Não olh(es)o para trás
Não quero ver.
Vais sofrer e eu vou sofrer.
Engoli o meu veneno
E agora vou sucumbir.
Come a papa.
Come a papa...
Egoísmo, pureza.
Seremos puros até à morte.
Com línguas negras.
E o elixir da vida nas entranhas.
Se não vês é porque não te ensinam a pescar.
Se não vês estarás cego.
Como eu cega, sempre cega.
Não vejo.
Não vi.
Não sinto.
Outros sentem por mim.
Abrigos.
Não há abrigos.
Há o fim.
Finda-se o destino na ponta dos meus dedos
Como se finda a areia no começo do mar.
Como cavalos e pombos que morrem no estádio.
Vou morrer no estádio.
Morro na relva.
Leva-me morta fora de ti.
Nojo.
À porta das entranhas termino-me.
E ninguém haverá de me achar.
Adeus.
Adeus.
Sempre.
Não de esceças de a comer, a papa.
Come a papa.
Come a papa.
Eu jogo pedras às maçãs e espero que caiam da árvore
E depois levanto-lhe as raizes
E enterro-me com ela.
E depois sou imortal.
Adeus, até um dia.
Se parto é para ir sem ficar.
Adeus, já parti.
Loucura, em mim.
Loucura.
Loucura, Lisboa.
Louca, Louca sim
Loucura,
adeus,
Loucura Lisboa,
Loucura
Lisboa.
Lisboa, Loucura ra ra ra
Loucura.
Loucu ra
Lou cu ra.
Insanidade.
Adeus, é este o fim.
Fim.

3 comentários:

  1. mesmo que quisesse comentar não conseguia fique, literalmente, de boca aberta e sem palavra. wow. <3


    ps: sabes que a laura leu outra vez josé luís peixoto na prova de leitura? leu excertos do morreste-me. só vi na gala, foi tão lindo que chorei. devias ter visto.

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  2. mas isso não se pergunta, o dia em que eu não gostar de um texto teu é porque algo de estranho se passa xD

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