7.1.12

Oh baby, baby it's a wild world



Já fui. Ninguém me pode dizer o contrário. Ninguém me pode acusar de olhar para trás. Ninguém pode dizer que não arrisquei. Já fui. E já ter ido enche-me verdadeiramente. Já fui, sem olhar para trás. Já me lancei à descoberta do desconhecido, sozinha, completamente sozinha. Nem pais, nem cão, nem amigos. Sozinha, completamente sozinha, criando raízes de raiz. E se há coisa de que me orgulho nesta vida, é disso. De ter ido, com medos, muitos medos, com muita coisa deixada para trás, mas ter engolido isso tudo no longo trago amargo, e ter desembocado à aventura, assim, de uma maneira seca e directa, sem rodeios. Sim, orgulho-me disto. De ter ido, de não me ter deixado ficar, de nunca me ter deixado ficar. E mesmo lá, nos piores dias de que me lembro, ter voltado a engolir sapos, tantos. Se há coisa que não me podem dizer, é que não arrisquei. Arrisquei em tudo, sempre. Todos os dias foram um risco. E depois de tudo o que correu mal, e de tudo o que correu bem, depois de ter ido, voltei. E voltei certa de que fiz o que devia ter feito. Voltei certa de que aquela tinha sido a maior aventura na minha vida, que me abriu tantos e tantos horizontes. Voltei, mas voltei porque fui. Porque soube o que era voltar depois de ter ido durante algum (tanto) tempo. E depois voltei, ligeiramente diferente, mais calma, mais ponderada, com a sede da aventura menos efusiva, mas com o desejo rompante de voltar a ir tantas outras vezes, a tantos outros lugares. Sim, orgulho-me verdadeiramente de afirmar que não pertenço a uma geração de conformados. Não. Eu, que sou da última geração dos últimos anos do século XX, cresci quando era mais divertido subir às árvores do que jogar consola, quando era mais divertido ir para os escuteiros do que ficar em casa a ver televisão, cresci tendo em conta a moral da Disney, e a vontade de subir a montanha para a casa da Heidi e do avô. Além de tudo, cresci num sítio pequeno, onde a liberdade não nos era proibida, onde podia correr alegremente com o meu cão, dos tantos que tive, e onde ninguém estava preocupado em que ninguém me raptasse, ou algum carro me atropelasse. Cresci num sítio onde fui livre de me mexer, de saltar, de pular, de esfolar tanto quando possível os joelhos, e de cair tantas e tantas vezes, e por cada queda aprender a levantar-me novamente. Será mau? Não, nunca foi mau. Porque todos os que viveram comigo, essa minha geração, esses meus amigos e conhecidos, que tiveram essa mesma liberdade de cair quando lhes foi possível aprenderam sempre a levantar-te, de todas as vezes, sozinhos, firmes, decididos. E é dessa minha geração que me dá alegria falar, dessa, que como eu, não se acomodavam ao sofá, mas iam lá fora ver o mundo acontecer, ainda que o mundo nessa altura fosse apenas onde a vista pudesse alcançar. Todas essas crianças do meu tempo, desse sítio onde crescemos livres, estão hoje por ai. Foram, como eu também fui, sem olhar para trás. Deixaram tudo, e deixar tudo foi forte, mas partiram. Certamente cairão muitas vezes pelo caminho, como eu cai, e como espero cair ainda mais, mas tal como nas tardes das brincadeiras em que se esfolavam centenas de joelhos nas correrias desenfreadas, e depois rapidamente se levantavam e continuavam a correr, também estes hoje fazem o mesmo, correm, caiem e levantam-se, sempre com a mesma convicção de outrora, sempre com a mesma alegria de quem correu e caiu com gosto, sempre com a mesma paixão de quem se voltou a levantar para continuar a correr, sabe-se lá por onde. O mundo é um lugar estranho, sim, mas são as paixões que impelem estes corações, estes, que não olham para trás para subir mais uma árvore. 

1 comentário:

  1. Que engraçado :) Li este teu texto pela segunda vez. Desta vez mais atenta. Mas absorvida por ele, mais ao seu encontro. Quero muito fazer o que fizeste. Muito!
    E parabéns. És extremamente talentosa! ;)

    ResponderEliminar